Antônio Melo: Um trilhão de desconfianças


Antônio Melo, jornalista - O Brasil está salvo, aprovou a reforma da previdência. Já tinha sido salvo há dois anos quando aprovou a “moderna” reforma trabalhista que ia fazer chover empregos por todos os rincões desse país tão grande, quanto otário parece ser. Ao contrário do que diziam o dr. Rogério Marinho, os entendidos entrevistados pelo Jornal Nacional e as entidades patronais, o emprego vive a maior seca. Basta olhar os cruzamentos com semáforos, as portas das repartições e as estatísticas do IBGE tudo cheio de desempregado fazendo malabarismos, biscate: 13,5% ou, 14 milhões de trabalhadores sem trabalho.
“Além da taxa, é preciso observar a população subutilizada, que é recorde em 15 unidades da federação, cobrindo metade das regiões Norte e Nordeste e quase todo o Sudeste, Sul e Centro-Oeste”.
Não se trata de opinião. É a análise do dr. Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do próprio IBGE do governo Bolsonaro ao divulgar os números do trimestre passado.
E noticiou o UOL na mesma ocasião: “A taxa da chamada subutilização da força de trabalho foi de 25% no primeiro trimestre do ano. Isso significa que faltou trabalho para 28,3 milhões de pessoas no Brasil, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). O contingente de pessoas subutilizadas é recorde na série iniciada em 2012. O grupo reúne os desocupados, os subocupados com menos de 40 horas semanais e pessoas disponíveis para trabalhar, mas que não conseguem procurar emprego por motivos diversos”.
Em 31 de agosto de 2016, quando Michel Temer assumiu a presidência depois de apear Dilma do cargo a que foi levada pelo voto, havia 11,8 milhões de desempregados no Brasil. Agora são 14 milhões.
Como se vê, a reforma trabalhista tirou direitos e força da classe trabalhadora. E, ao contrário do que apregoava, não reduziu o desemprego: aumentou. O único emprego novo que estou sabendo é o que o presidente Bolsonaro pretende dar ao filho Eduardo Zero Não Sei Quanto, de embaixador do nosso país nos Estados Unidos, O posto mais cobiçado na carreira diplomática da qual os Zeros não fazem parte.
Somos mesmo um país de otários.
Agora é a vez da previdência. Vai salvar o Brasil, de novo. Em dez anos vamos economizar mais de 1 trilhão de reais, douraram a pílula. Aliás, o mesmo “vendedor” do pacote é o ex-deputado Rogério Marinho, PSDB-Rn, que, como profeta, anunciou os milhões de empregos que a salvadora reforma trabalhista traria. E deu no que deu. Pois bem, é ele mesmo. Então, prepare-se.
Já se sabe que o 1 trilhão anunciado já não é mais 1 trilhão. É que os ruralistas deram uma mordidinha de mais de 8 bilhões de reais, deixando agora de pagar contribuição previdenciária sobre o que exportarem. Poxa, e eu, otário que pensava que a reforma da previdência era para botar e não tirar dinheiro para as aposentadorias, para que paraplégico não tenha de subir escada com a bunda porque o elevador imprevidente do INSS quebrado desde fevereiro e que não consertam.
Ah, estima-se que só com as isenções dadas, inclusive às igrejas, com os tratamentos especiais dispensado a certas categorias, a tal reforma foi desidratada em algo como 30 bilhões de reais. E ainda tiraram estados e municípios -todos quebrados- do texto aprovado. Ou seja: Brasil mesmo, só o governo federal. E eu pensava que a gente vivia no município, no estado.
O problema é que quando o calo aperta -quando o dinheiro falta, como já está faltando- governadores e prefeitos se socorrem de quem? Da União, é claro. E aí o rombo aumenta mais. Para a gente entender o tamanho da mordida nos cálculos do 1,24 trilhão de economia tão difundidos, basta mostrar que os estados ao longo de 10 anos, teriam uma economia de R$ 350,66 bilhões, segundo garantia o ministro Paulo Guedes na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e depois publicava em nota no site oficial do ministério da economia. Portanto, não é a imprensa que está dizendo.
Bem, generoso que sou, não estou contabilizando os mais de 2 bilhões com que o presidente brindou os deputados para votar a reforma, reinaugurando a sua versão do “é dando que se recebe”, aquele jeito novo de fazer política que prometeu na campanha. E você que votou no Mito por conta da nova política -tá lembrado?- deve ter descoberto que fez papel de otário, ou ainda não deu para perceber?
Mas não se preocupe, somos todos otarianos.
Pequenas questões: por que o dr. Dallagnol recusou o convite do congresso para falar sobre as conversas suspeitas com o juiz Sérgio Moro? Quando a caixa preta do BNDES vai ser realmente aberta? E a caixa preta do senador Zero Bolsonaro lá na Assembleia do Rio? Quando a PF vai ouvir Queiróz, o assessor milionário do então deputado e hoje Zero-senador? Quando os procuradores da república de Curitiba vão entregar os seus celulares para a PF averiguar aquelas conversas reveladas pelo Intercept?
Há dois anos, no dia 26 de abril de 2017, a reforma trabalhista era aprovada na Câmara Federal por 296 votos a favor e 177 contra. Em 11 de julho o Senado, por 50 a 26, mandava às favas um monte de direitos trabalhistas em nome da modernidade tão reclamada pelo tal mercado e, dois dias depois, o presidente Temer assinava, com pompa e circunstância, a tão propalada lei.
O potiguar Rogério Marinho, à época deputado federal tucano, foi o relator de tão festejado projeto de lei. Segundo ele haveriam fábricas de empregos, o trabalhador seria o grande beneficiado, as empresas, libertas dos grilhões protecionistas gerariam vagas e mais vagas. E o Brasil iria fazer par com as grandes economias do mundo, dançando no baile da riqueza o samba da modernidade.
Com a mesma desenvoltura que hoje anuncia as benesses que virão quando da aprovação da reforma previdenciária, Rogério Marinho naquela época saracoteava pelo congresso com as suas miçangas, apitos e espelhinhos mágicos trocando-os pelo imposto sindical e outras garantias que tornavam os trabalhadores mais organizados e mais fortes nas negociações. Ao mesmo tempo deixou intocável semelhante contribuição sindical do chamado Sistema S, que sai justamente da folha de pagamento das empresas, leia-se dos mesmos trabalhadores, para as entidades empresariais.
Mas quarta feira última, dois dias antes de se completarem os dois anos da aprovação na Câmara da milagrosa lei, o Brasil bateu mais um recorde no seu desemprego. Acrescentou aos 13 milhões de desafortunados, mais 47 mil homens e mulheres que foram mandados para o olho da rua.
O doutor Rogério e sua trupe pode ter enganado os caboclos lá da aldeia do Congresso com as suas miçangas, os seus espelhinhos e apitos. Agora, os caboclos aqui da aldeia dos potiguares não conseguiu fazer de besta não. Levou foi uma traulitada certeira nas eleições. Logo ele que imaginava que com exposição que teve, relator da reforma, todo dia na mídia, renovar o mandato seria uma barbada, um passeio.
A lição que fica é que senador e deputado podem ser bobos, espertos, trambiqueiros, enganadores, pulhas. Mas é bom ir abrindo o olho pois o povo já foi ingênuo. Já foi, mas está ficando esperto que é uma beleza. Enganar ele não é mais tão fácil. Veja aí quanto figurão da política aqui do estado e por este Brasil a fora foi mandado para a salmoura.
Então, é preciso ficar esperto com essa história da reforma da previdência. Que ela é uma necessidade, parece indiscutível. Mas querer que quem pague a conta seja mais uma vez os pequenos, isso não. Vir de novo com espelhinhos, miçangas e apitos, dá mais não. É preciso transparência. Mostrar direitinho como foram feitas as contas para esses estudos, de onde querem tirar o dinheiro, de quem, em quanto tempo, quem ganha, quem perde.
O povo mesmo já está perdendo de todo jeito. O salário mínimo que tinha ganho real desde os tempos de Fernando Henrique, agora não tem mais. O Bolsa Família nem aumento real e nem mesmo o reajuste pela inflação. Mas dizem que terá décimo terceiro. Quem sobreviver terá.
Mas os combustíveis sobem, a energia sobe, o gás sobe, a água o aluguel sobe, o frete sobe e os filhos de Bolsonaro arengam com o vice-presidente.
Será pelo bem do Brasil?

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