Edgar Moreno: Meu amigo Virtuálisson

Por Edgar Moreno
COSTA FILHO, João Batista da que também representa o heterônimo Edgar Moreno.

Em frente ao Vanguard funcionou por algum tempo a sede do antigo INPS. Hoje jaz ali um barracão da SEMUC (Secretaria Municipal de Cultura), onde artistas quase anônimos como Ejoão Martins, Urquiza e Gleydson preparam a decoração das festividades municipais. Pouca gente sabe, mas são esses generosos e criativos artífices da cultura local os responsáveis pela beleza decorativa que abrilhanta os carnavais, as festas juninas, natalinas, cívicas e até políticas dessa ingrata cidade. São eles quem atravessa madrugadas para preparar o “bolo” festivo, do qual não comprazem em saboreá-lo. A festa é do povo; eles são artistas e servidores públicos.


Em outros tempos ao lado desse casarão tinha o Beco da Bosta, que, odorento, estendia-se até a Praça Catulo da Paixão Cearense. Isso me lembra que em criança, passei por ali com meu pai para “cortar volta”. Lembra-me também a poesia de Iraide Martins em seu trocadilho irônico “o Beco da Bosta, a bosta do Beco”.


É por ali perto que passeia Astrogildo. Dobra a XV de Novembro, para por um instante para lembrar a (figueira?) que encimava seus frondosos galhos para a Prefeitura. E não adiantaram os protestos artísticos da época. Ela foi ao chão.
É, parece que artista não tem mesmo vez por aqui, mas então o meio ambiente também já era desrespeitado. Que o diga a casa Vila Maria que testemunhou o assassinato da nossa árvore decenária. A Vila, porém, felizmente, ainda resiste ao tempo para comprovar que também já não existe o prédio-esquina da antiga Secretaria de Finanças. Por que não construí-la em vez do aluguel?


Um grupo de estudantes passa galhofeiro. Astrogildo olha os modos de uma juventude tão diferente do seu tempo. A galera fotografa com digital de 12 MP e filma com celulares touch wi-fi, bem diferentes da Canon de outrora. O gesto é inevitável: “’Xô ver! Mostra aqui”. Todo mundo quer ver como ficou na foto. Uns não gostam de sua pose, de sua espinha, mas outro rebate que para o foto shop toda feiura tem jeito. E a câmera corre de mão em mão. Toca um celular. “Oi, eu tô aqui perto da Biasa”. Astrogildo questiona consigo: Quem perguntou onde a mocinha estava? Cadê a Biasa, que ele não via? Nesse mundo virtual mentir e fazer bobagem é tão comum! Sem contar o que fazem com a Língua Portuguesa: vc ñ ker qeu add tbm? kkk e tantas outras simplificações. Melhor é deixá-los com suas mazelas e tecnologias.


Astrogildo vai-se beirando a Praça Chagas Araújo, passa pela Catulo, dobra a pracinha da Conceição e vai parar na Santa Terezinha. No contorno da Capoeira Zâmbi uma breve imagem lhe vem à cabeça. Vira-se, mas qual! Não mais consegue ver a casinha da fazenda do Coronel Lourenço da Silva. Era um dos pontos mais bem conservados de nossa a história. Um dia, simplesmente foi demolida e em seu lugar a Paróquia ergueu um sobrado.


Sem o beco, sem a árvore, a Casa de Finanças e a fazendinha de taipa, resta ao homem voltar ao seu rebento. Um toque ressoa, porém. Astrogildo retira do bolso seu moderno celular, põe os óculos e confirma baixinho: “É meu amigo Virtuálisson”. E pondo o fone de ouvido: “Oi, eu tô aqui na...

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