Precipuamente o texto versa sobre a dívida de jogo adquirida no exterior verificando a cobrança no Brasil via Carta Rogatória, sob á luz do ordenamento jurídico brasileiro, inserido ao Direito Internacional Privado.
A Carta Rogatória é a requisição feita à Justiça de outro país para a prática de uma diligência judicial, obedecerá, quanto à sua admissibilidade e modo de seu cumprimento, ao disposto na Convenção Internacional. Diante o procedimento, será remetida à autoridade judiciária estrangeira, por via diplomática, depois de traduzida para a língua do país em que há de praticar-se o ato. A carta rogatória será redigida no idioma do Estado deprecante e será acompanhada de uma tradução feita no idioma do Estado deprecado, devidamente certificada por intérprete juramentado.
Com a expansão da globalização e das empresas multinacionais e até mesmo a ampliação das condições de o sujeito se locomover com facilidade por vários países diferentes, não pode este, ficar imune às diversas demandas que pode vir a sofrer. Em razão disso, a comunidade jurídica vem se preocupando, cada dia mais, com a criação de mecanismos que possibilitem a chamada cooperação jurídica internacional.
Neste diapasão surge a necessidade de se realizarem certos atos que se encontram fora dos limites territoriais de competência dos magistrados. Diante a cooperação internacional, a Carta Rogatória sem a qual, não poderá ser praticado o ato, valendo-se o Estado de outros meios menos eficazes para suprir sua falta, ou, ainda, se praticado, estará sujeito à pena de nulidade, neste caminho, a questão a analisar criticamente é a mudança de posiconamento da justiça brasileira ao caso exposto na decisão do STF, sobre dívida de jogo no exterior:
DÍVIDA DE JOGO - ATIVIDADE LÍCITA NA ORIGEM - AÇÃO - CONHECIMENTO -CARTA ROGATÓRIA - EXECUÇÃO DEFERIDA. DÍVIDA DE JOGO CONTRAÍDA NO EXTERIOR. PAGAMENTO COM CHEQUE DE CONTA ENCERRADA. ART. 9º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. ORDEM PÚBLICA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO.
- 1. O ordenamento jurídico brasileiro não considera o jogo e a aposta como negócios jurídicos exigíveis. Entretanto, no país em que ocorreram, não se consubstanciam tais atividades em qualquer ilícito, representando, ao contrário, diversão pública propalada e legalmente permitida, donde se deduz que a obrigação foi contraída pelo acionado de forma lícita [...]. Pelas razões acima, defiro a execução desta carta rogatória, a ser remetida à Justiça Federal de São Paulo, para a ciência pretendida. 4. Publique-se. Brasília, 11 de dezembro de 2002. Ministro MARÇO AURÉLIO Presidente
Referencias ao jogo no mundo: cada Estado, no âmbito de sua competência interna, define a licitude do jogo e quais, dentre suas diversas modalidades, quais são as permitidas dentro de seu território. No caso dos Estados Unidos da América, segundo Cooper (2004), 48 estados haviam legalizado alguma forma de jogo. Destes, 27 têm previsão legal para existência de cassinos, nos moldes de Nevada e Atlantic City. Esta modalidade está devidamente legalizada, na América do Sul, tanto no Paraguai, como no Uruguai (Punta del Este).
Enquanto no Brasil pelo disposto no § 2º, do artigo 814 do Código Civil 2002, excetuam-se aqueles legalmente permitidos os patrocinados pelo Governo Federal, através da Caixa Econômica Federal, podem encontrar os seguintes jogos: Lotofácil, Loteca, Lotogol, Lotomania, Loteria Instantânea, Loteria Federal, Quina, Mega-Sena e Dupla Sena, e os demais, são contravenções.
Diante o exposto jurisprudencial e referencial a cada estado, o jogo explorado por cassinos é lícito em diversas partes do mundo, sendo atividade proibida pela legislação brasileira. Resta saber se a dívida contraída por um brasileiro, em um cassino legalizado no exterior, é passível de ser judicialmente executada no Brasil de acordo com o ordenamento jurídico vigente, sem ofender a ordem pública, os bons costumes e a soberania nacional.
Já em referencia a decisão, o caso diverge de duas leis conflitantes, podendo ofender a ordem pública a soberania nacional e os bons costumes, adentra-se de competência concorrente de leis alienígenas com a lex fori. Contudo, entre 2001 e 2002, houve nova interpretação sobre o tema, o Ministro Marco Aurélio Mello admitido o exequatur para citação de devedores de jogo, nos autos da Carta Rogatória nº 9.897, oriunda dos Estados Unidos da América (No mesmo sentido: CR 9.970, CR 10.415, CR 10.416 e CR 10.416 ED), sob o fundamento de que a lei a ser utilizada seria a norte-americana, de acordo com o art. 9º da LICC, por ser lícito o jogo no local onde foi contraído, afastaria a incidência do art. 1.477 do Código Civil, não havendo, pois, atentado à ordem pública, prevista no art. 17 da LICC.
Entretanto ao assumir a presidência do STF em 2003, o Ministro Maurício Corrêa houve por modificar o entendimento de seu antecessor, reconsiderando a decisão de concessão do exequatur, em sede de Embargos Infringentes à Carta Rogatória nº 10.415 (no mesmo sentido: CR 10.416 AgR), sob o fundamento de atentado à ordem pública. Com a edição da Emenda Constitucional nº 45, de 08/12/04, alterou-se o texto constitucional: a competência para conceder exequatur a cartas rogatórias e homologar sentenças estrangeiras passou a ser do Superior Tribunal de Justiça.
Significa interpretar, para o Ministro Maurício Corrêa a ordem pública, diante sua subjetividade seria os máximos morais locais do magistrado a decidir o caso concreto. Entretanto, nos tempos atuais, na aplicação da ordem pública nacional, sobre a ordem pública do direito internacional privado incidente na indicação de lei estrangeira a solução do caso concreto pelas regras de conexão do foro e cooperação do direito internacional. Os valores axiológicos exigiram a repulsa da ordem jurídica estrangeira sob a luz do dialogo intercultural cosmopolita, mediante ao qual o ser humano tem o direito de ser tratado no âmbito da moralidade do foro.
Destarte, da aplicação dessa construção teórica fundada em conceitos complementares ao instituto de exceção do direito internacional privado conclui-se que sua instabilidade, a maior de suas características apontadas pela doutrina, se refere a sua plasticidade, sua adaptabilidade à época e ao local, no qual ele se localiza, mas não se traduziria na impossibilidade de se estabelecerem critérios menos subjetivos a sua aferição. (VASCONCELOLOS, P. 245).
A ordem pública, segundo Vasconcelos, (p. 218), no conflito de leis no espaço, a atuação do direito internacional privado no estabelecimento de regras para a solução de litígios parte do pressuposto da extraterritorialidade das leis e permite que, ao menos em situações excepcionais, os sistemas legais vislumbrem e até exijam a aplicação da lei estrangeira no território a eles submetido.
A existência de múltiplos ordenamentos tem como consequência natural, entretanto, a possibilidade de cada um dos grupos legais disponíveis apresentar aos juristas soluções distintas e, inclusive, divergentes quando da análise de casos concretos. Nesse sentido, é de se observar, preliminarmente, que quando restrita a questão judicial ao âmbito territorial de uma ordem normativa específica não há, observadas as regras de validade, hipótese de conflito de leis e limitada se encontra, também, a probabilidade de múltiplas soluções se disponibilizarem ao magistrado.
Quando encerrado o conflito em um único sistema jurídico, tanto as partes, quanto o objeto da contenda e o órgão jurisdicional encontram-se na verdade, conectados de forma exclusiva àquela solução apresentada pelos instrumentos normativos do ordenamento, é compreensão de Vasconcelos
Fica a entender que a ordem pública é um conceito uno e será sempre de direito interno, uma vez que sua finalidade é apenas uma, na lição de Luiz Olavo Baptista (1999, p. 42): manter a coerência do sistema jurídico. Assim, a ordem pública age no direito interno impedindo certos pactos, sendo aí confundida com as leis imperativas.
No âmbito do direito internacional privado, este princípio assume, por vezes, o papel de negação do próprio DIP (Dolinger 1979, p. 4), na medida em que impede a aplicação da lei estrangeira indicada pela regra de conflitos. Assim, a ordem pública atua, ainda segundo Dolinger (1979, p. 256), [...] no direito internacional privado, em um primeiro grau, ao rejeitar a aplicação de leis estrangeiras no foro e em um segundo grau, mais grave e mais restrito, quando rejeita reconhecimento a sentenças estrangeiras ou eficácia a contratos consolidados no exterior.
Diante o exposto, há entendimento que a lei brasileira remete à lei estrangeira como sendo a competente para regular a matéria obrigacional, afastando, por conseguinte, a lei nacional. Portanto, não cabe ao juiz do foro se utilizar do ordenamento jurídico para julgar a legalidade da dívida de jogo nem, tampouco, se essa dívida é passível de cobrança, ele deve verificar se essa dívida é legal e exigível, de acordo com a legislação de onde foi constituída a obrigação.
Quanto ao impacto desta dessa decisão para o Direito Internacional Privado, com referências a jurisprudência brasileira tem se mostrado dividida quanto à admissibilidade da cobrança de dívida de jogo. Os que entendem ser incobrável o débito fundamentam sua posição em dois dispositivos legais: artigo 814 do CC/2002 (redação equivalente ao artigo 1.477 do CC/1916) dispõe que as dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento. O reconhecimento de tal dívida importaria em atentado à ordem pública, nos termos do artigo 17 da LICC, em virtude de o jogo praticado em cassinos ser considerado como contravenção penal, nos termos do artigo 50 da LCP.
Enquanto os que são favoráveis entendem pelas seguintes razões: O artigo 814 do CC/2002 só tem aplicabilidade quando a dívida de jogo for contraída no território nacional. Sendo contraída em outro país, vigora o artigo 9º da LICC: para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. Para as obrigações, o direito brasileiro elegeu como elementos de conexão a lei do local da realização do ato jurídico para reger suas formalidades (locus regit actum), bem como sua substância (lex locus actus). Desta forma, a decisão em favor exequatur, leva o Direito Internacional Privado a se adequar diante dos novos tempos a cooperação jurídica internacional colaborando com a globalização.
Com volta ao princípio da ordem pública só deve ser utilizado se o resultado da aplicação da lei ou do reconhecimento da sentença estrangeira levar a um resultado intolerável, de forma a abalar os próprios fundamentos da ordem jurídica interna. Então a ordem pública, a doutrina as reconhece como sendo as leis absolutamente imperativas ou proibitivas, cujo descumprimento é fulminado por nulidade.
Por fim, prática de jogos de azar não pode ser considerada fundamental da ordem jurídica interna, suficiente à aplicação da reserva de ordem pública. A própria lei as define, não como crime, mas como mera contravenção, um tipo penal menor.
A decisão impacta quanto aplicar a legislação estrangeira em território nacional, não significa uma redução da soberania do Estado, mas sim a compreensão de que dessa forma se fará melhor justiça, uma vez que a relação jurídica possui maior conexão com o direito estrangeiro do que com o nacional.
Em outro ponto específico, encontra-se a doutrina, interpreta a referida decisão, a um conjunto, juntamente com o artigo 337 do CPC, já extinto, entendendo que a lei estrangeira foi equiparada à lei municipal e estadual, e consequentemente também será de aplicação obrigatória como as referidas leis, independentemente da provocação das partes ou de sua comprovação. Depreende-se assim, com o reforço dado pela redação do artigo 408 do Código de Bustamante (ratificado no Brasil pelo Decreto nº 18.871 de 13/08/1929), que o juiz deve aplicar a lei estrangeira de ofício, podendo ela ser alegada a qualquer tempo e fase processual.
Por fim, a decisão impacta sobre as Cartas Rogatórias, que são os meios de comunicação processual utilizadas no intercâmbio processual, dirigida exclusivamente à autoridade estrangeira para ratifica-se que o instituto homologação de sentença estrangeira, visa efetivar o cumprimento de sentença julgada em território alienígena, em que pese apresentar questões problemáticas decorrentes de pedido homologatório, que envolva a soberania nacional, os bons costumes e a ordem pública, durante a execução da cooperação jurídica internacional.
Que Deus nos abençoe!
Por Claudson Alves de Oliveira
(Dodó Alves)
Claudson Alves Oliveira – Bacharel em Direito, American College of Brazilian Studies, 37 N Orange Avenue, Suite 500, Downtown Orlando, Florida, 32801.
A Carta Rogatória é a requisição feita à Justiça de outro país para a prática de uma diligência judicial, obedecerá, quanto à sua admissibilidade e modo de seu cumprimento, ao disposto na Convenção Internacional. Diante o procedimento, será remetida à autoridade judiciária estrangeira, por via diplomática, depois de traduzida para a língua do país em que há de praticar-se o ato. A carta rogatória será redigida no idioma do Estado deprecante e será acompanhada de uma tradução feita no idioma do Estado deprecado, devidamente certificada por intérprete juramentado.
Com a expansão da globalização e das empresas multinacionais e até mesmo a ampliação das condições de o sujeito se locomover com facilidade por vários países diferentes, não pode este, ficar imune às diversas demandas que pode vir a sofrer. Em razão disso, a comunidade jurídica vem se preocupando, cada dia mais, com a criação de mecanismos que possibilitem a chamada cooperação jurídica internacional.
Neste diapasão surge a necessidade de se realizarem certos atos que se encontram fora dos limites territoriais de competência dos magistrados. Diante a cooperação internacional, a Carta Rogatória sem a qual, não poderá ser praticado o ato, valendo-se o Estado de outros meios menos eficazes para suprir sua falta, ou, ainda, se praticado, estará sujeito à pena de nulidade, neste caminho, a questão a analisar criticamente é a mudança de posiconamento da justiça brasileira ao caso exposto na decisão do STF, sobre dívida de jogo no exterior:
DÍVIDA DE JOGO - ATIVIDADE LÍCITA NA ORIGEM - AÇÃO - CONHECIMENTO -CARTA ROGATÓRIA - EXECUÇÃO DEFERIDA. DÍVIDA DE JOGO CONTRAÍDA NO EXTERIOR. PAGAMENTO COM CHEQUE DE CONTA ENCERRADA. ART. 9º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. ORDEM PÚBLICA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO.
- 1. O ordenamento jurídico brasileiro não considera o jogo e a aposta como negócios jurídicos exigíveis. Entretanto, no país em que ocorreram, não se consubstanciam tais atividades em qualquer ilícito, representando, ao contrário, diversão pública propalada e legalmente permitida, donde se deduz que a obrigação foi contraída pelo acionado de forma lícita [...]. Pelas razões acima, defiro a execução desta carta rogatória, a ser remetida à Justiça Federal de São Paulo, para a ciência pretendida. 4. Publique-se. Brasília, 11 de dezembro de 2002. Ministro MARÇO AURÉLIO Presidente
Referencias ao jogo no mundo: cada Estado, no âmbito de sua competência interna, define a licitude do jogo e quais, dentre suas diversas modalidades, quais são as permitidas dentro de seu território. No caso dos Estados Unidos da América, segundo Cooper (2004), 48 estados haviam legalizado alguma forma de jogo. Destes, 27 têm previsão legal para existência de cassinos, nos moldes de Nevada e Atlantic City. Esta modalidade está devidamente legalizada, na América do Sul, tanto no Paraguai, como no Uruguai (Punta del Este).
Enquanto no Brasil pelo disposto no § 2º, do artigo 814 do Código Civil 2002, excetuam-se aqueles legalmente permitidos os patrocinados pelo Governo Federal, através da Caixa Econômica Federal, podem encontrar os seguintes jogos: Lotofácil, Loteca, Lotogol, Lotomania, Loteria Instantânea, Loteria Federal, Quina, Mega-Sena e Dupla Sena, e os demais, são contravenções.
Diante o exposto jurisprudencial e referencial a cada estado, o jogo explorado por cassinos é lícito em diversas partes do mundo, sendo atividade proibida pela legislação brasileira. Resta saber se a dívida contraída por um brasileiro, em um cassino legalizado no exterior, é passível de ser judicialmente executada no Brasil de acordo com o ordenamento jurídico vigente, sem ofender a ordem pública, os bons costumes e a soberania nacional.
Já em referencia a decisão, o caso diverge de duas leis conflitantes, podendo ofender a ordem pública a soberania nacional e os bons costumes, adentra-se de competência concorrente de leis alienígenas com a lex fori. Contudo, entre 2001 e 2002, houve nova interpretação sobre o tema, o Ministro Marco Aurélio Mello admitido o exequatur para citação de devedores de jogo, nos autos da Carta Rogatória nº 9.897, oriunda dos Estados Unidos da América (No mesmo sentido: CR 9.970, CR 10.415, CR 10.416 e CR 10.416 ED), sob o fundamento de que a lei a ser utilizada seria a norte-americana, de acordo com o art. 9º da LICC, por ser lícito o jogo no local onde foi contraído, afastaria a incidência do art. 1.477 do Código Civil, não havendo, pois, atentado à ordem pública, prevista no art. 17 da LICC.
Entretanto ao assumir a presidência do STF em 2003, o Ministro Maurício Corrêa houve por modificar o entendimento de seu antecessor, reconsiderando a decisão de concessão do exequatur, em sede de Embargos Infringentes à Carta Rogatória nº 10.415 (no mesmo sentido: CR 10.416 AgR), sob o fundamento de atentado à ordem pública. Com a edição da Emenda Constitucional nº 45, de 08/12/04, alterou-se o texto constitucional: a competência para conceder exequatur a cartas rogatórias e homologar sentenças estrangeiras passou a ser do Superior Tribunal de Justiça.
Significa interpretar, para o Ministro Maurício Corrêa a ordem pública, diante sua subjetividade seria os máximos morais locais do magistrado a decidir o caso concreto. Entretanto, nos tempos atuais, na aplicação da ordem pública nacional, sobre a ordem pública do direito internacional privado incidente na indicação de lei estrangeira a solução do caso concreto pelas regras de conexão do foro e cooperação do direito internacional. Os valores axiológicos exigiram a repulsa da ordem jurídica estrangeira sob a luz do dialogo intercultural cosmopolita, mediante ao qual o ser humano tem o direito de ser tratado no âmbito da moralidade do foro.
Destarte, da aplicação dessa construção teórica fundada em conceitos complementares ao instituto de exceção do direito internacional privado conclui-se que sua instabilidade, a maior de suas características apontadas pela doutrina, se refere a sua plasticidade, sua adaptabilidade à época e ao local, no qual ele se localiza, mas não se traduziria na impossibilidade de se estabelecerem critérios menos subjetivos a sua aferição. (VASCONCELOLOS, P. 245).
A ordem pública, segundo Vasconcelos, (p. 218), no conflito de leis no espaço, a atuação do direito internacional privado no estabelecimento de regras para a solução de litígios parte do pressuposto da extraterritorialidade das leis e permite que, ao menos em situações excepcionais, os sistemas legais vislumbrem e até exijam a aplicação da lei estrangeira no território a eles submetido.
A existência de múltiplos ordenamentos tem como consequência natural, entretanto, a possibilidade de cada um dos grupos legais disponíveis apresentar aos juristas soluções distintas e, inclusive, divergentes quando da análise de casos concretos. Nesse sentido, é de se observar, preliminarmente, que quando restrita a questão judicial ao âmbito territorial de uma ordem normativa específica não há, observadas as regras de validade, hipótese de conflito de leis e limitada se encontra, também, a probabilidade de múltiplas soluções se disponibilizarem ao magistrado.
Quando encerrado o conflito em um único sistema jurídico, tanto as partes, quanto o objeto da contenda e o órgão jurisdicional encontram-se na verdade, conectados de forma exclusiva àquela solução apresentada pelos instrumentos normativos do ordenamento, é compreensão de Vasconcelos
Fica a entender que a ordem pública é um conceito uno e será sempre de direito interno, uma vez que sua finalidade é apenas uma, na lição de Luiz Olavo Baptista (1999, p. 42): manter a coerência do sistema jurídico. Assim, a ordem pública age no direito interno impedindo certos pactos, sendo aí confundida com as leis imperativas.
No âmbito do direito internacional privado, este princípio assume, por vezes, o papel de negação do próprio DIP (Dolinger 1979, p. 4), na medida em que impede a aplicação da lei estrangeira indicada pela regra de conflitos. Assim, a ordem pública atua, ainda segundo Dolinger (1979, p. 256), [...] no direito internacional privado, em um primeiro grau, ao rejeitar a aplicação de leis estrangeiras no foro e em um segundo grau, mais grave e mais restrito, quando rejeita reconhecimento a sentenças estrangeiras ou eficácia a contratos consolidados no exterior.
Diante o exposto, há entendimento que a lei brasileira remete à lei estrangeira como sendo a competente para regular a matéria obrigacional, afastando, por conseguinte, a lei nacional. Portanto, não cabe ao juiz do foro se utilizar do ordenamento jurídico para julgar a legalidade da dívida de jogo nem, tampouco, se essa dívida é passível de cobrança, ele deve verificar se essa dívida é legal e exigível, de acordo com a legislação de onde foi constituída a obrigação.
Quanto ao impacto desta dessa decisão para o Direito Internacional Privado, com referências a jurisprudência brasileira tem se mostrado dividida quanto à admissibilidade da cobrança de dívida de jogo. Os que entendem ser incobrável o débito fundamentam sua posição em dois dispositivos legais: artigo 814 do CC/2002 (redação equivalente ao artigo 1.477 do CC/1916) dispõe que as dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento. O reconhecimento de tal dívida importaria em atentado à ordem pública, nos termos do artigo 17 da LICC, em virtude de o jogo praticado em cassinos ser considerado como contravenção penal, nos termos do artigo 50 da LCP.
Enquanto os que são favoráveis entendem pelas seguintes razões: O artigo 814 do CC/2002 só tem aplicabilidade quando a dívida de jogo for contraída no território nacional. Sendo contraída em outro país, vigora o artigo 9º da LICC: para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. Para as obrigações, o direito brasileiro elegeu como elementos de conexão a lei do local da realização do ato jurídico para reger suas formalidades (locus regit actum), bem como sua substância (lex locus actus). Desta forma, a decisão em favor exequatur, leva o Direito Internacional Privado a se adequar diante dos novos tempos a cooperação jurídica internacional colaborando com a globalização.
Com volta ao princípio da ordem pública só deve ser utilizado se o resultado da aplicação da lei ou do reconhecimento da sentença estrangeira levar a um resultado intolerável, de forma a abalar os próprios fundamentos da ordem jurídica interna. Então a ordem pública, a doutrina as reconhece como sendo as leis absolutamente imperativas ou proibitivas, cujo descumprimento é fulminado por nulidade.
Por fim, prática de jogos de azar não pode ser considerada fundamental da ordem jurídica interna, suficiente à aplicação da reserva de ordem pública. A própria lei as define, não como crime, mas como mera contravenção, um tipo penal menor.
A decisão impacta quanto aplicar a legislação estrangeira em território nacional, não significa uma redução da soberania do Estado, mas sim a compreensão de que dessa forma se fará melhor justiça, uma vez que a relação jurídica possui maior conexão com o direito estrangeiro do que com o nacional.
Em outro ponto específico, encontra-se a doutrina, interpreta a referida decisão, a um conjunto, juntamente com o artigo 337 do CPC, já extinto, entendendo que a lei estrangeira foi equiparada à lei municipal e estadual, e consequentemente também será de aplicação obrigatória como as referidas leis, independentemente da provocação das partes ou de sua comprovação. Depreende-se assim, com o reforço dado pela redação do artigo 408 do Código de Bustamante (ratificado no Brasil pelo Decreto nº 18.871 de 13/08/1929), que o juiz deve aplicar a lei estrangeira de ofício, podendo ela ser alegada a qualquer tempo e fase processual.
Por fim, a decisão impacta sobre as Cartas Rogatórias, que são os meios de comunicação processual utilizadas no intercâmbio processual, dirigida exclusivamente à autoridade estrangeira para ratifica-se que o instituto homologação de sentença estrangeira, visa efetivar o cumprimento de sentença julgada em território alienígena, em que pese apresentar questões problemáticas decorrentes de pedido homologatório, que envolva a soberania nacional, os bons costumes e a ordem pública, durante a execução da cooperação jurídica internacional.
Que Deus nos abençoe!
Por Claudson Alves de Oliveira
(Dodó Alves)
Claudson Alves Oliveira – Bacharel em Direito, American College of Brazilian Studies, 37 N Orange Avenue, Suite 500, Downtown Orlando, Florida, 32801.