Antônio Melo: Apesar de você

Antônio Melo, jornalista - Ponha de lado os hambúrgueres, a tomada de três pinos, a suspensão da cobrança de ingresso em áreas de preservação ambiental, as inconstitucionalidades contidas no decreto das armas, as bobagens ditas sobre a transferência da embaixada do Brasil em Israel, os ataques à China nosso maior parceiro comercial -esqueça tudo isso porque há alguns bons sinais.
O mercado imobiliário começa a vender seus estoques de imóveis com a queda dos juros e da agiotagem dos bancos nos financiamentos da casa própria. A inflação continua controlada, inclusive abaixo da meta, o “mercado” está mais otimista. A reforma da previdência, cujo leme foi tomado por Rodrigo Maia, foi aprovada 300 bilhões de reais a menos do que anunciara o governo, mas foi.
Enquanto isso Paulo Guedes foi rebaixado de superministro brigador para papagaio de pirata do presidente no Mercosul. E papagaio mudo: pela previdência do seu ministério fala Rogério Marinho, sobre o FGTS a medida econômica que iria injetar bilhões na economia, quem está falando é o Onix Lorenzoni. Aliás, o anúncio das medidas que seria feito com pompa em cerimônia para comemorar os 200 dias de governo no Palácio do Planalto deu chabu, ficou para a semana que vem.
Sabe porquê?
A coisa aconteceu mais ou menos assim: o presidente Jair Bolsonaro recebeu fora da agenda dois empreiteiros poderosos que foram alerta-lo que a medida liberando os 40 bilhões do FGTS seria um tiro no pé. Serviria só para agravar a crise, como aconteceu em 2017 quando Temer fez o mesmo liberando 44 bilhões do Fundo. A construção civil sofreu um baque e o desemprego aumentou. Reforçando a tese, o deputado Marcelo Ramos, presidente da Comissão Especial da Reforma da Previdência disparou do seu twitter dizendo que o plano de liberar o FGTS não passa de um “voo de pato para a economia”.
Daí o recuo.
Os bons sinais -poucos, ainda- não justificam tanto otimismo do presidente: “a economia vai bem”. Não vai. E ele deveria saber disso. São 13 milhões de desempregados ou 25 milhões de subemprempregados. O país está em estagnação econômica, faltam remédios de uso contínuo, vacinas, não há investimento.
O presidente certamente ainda tem gordura da sua eleição para queimar. Mas resta muito pouco. O Brasil está parado. Bolsonaro administra como se governasse a própria casa fazendo a vontade dos filhos numéricos. Um se diverte em “atirar” nos ministros amigos do pai com pontaria invejável, derrubando-os. Já outro, é trabalhoso. Está enrolado aí numas histórias cabeludas envolvendo “rachadinhas”, funcionários fantasmas, milicianos e Queiróz, o dos depósitos fantasmas, do cheque fantasma, ele mesmo o fantasma que sumiu. Tem ainda o Zero Eduardo Fritador de Hambúrguer num restaurante que não vende hambúrguer, que tem prometido de presente de aniversário o posto de embaixador do Brasil na embaixada mais importante do mundo, a dos Estados Unidos.
Mas Bolsonaro é assim, um homem de futuro. Deveria estar cuidando do país do presente. Mas não, ele está com os olhos no amanhã. Mais especificamente em 2022. Outubro de 2022, reeleição. Todo prefeito, governador, presidente que conheci ou tive notícia sempre quis deixar o debate da sucessão para o ano em que ela vai se dá, se possível depois de março, porque antecipar o debate sucessório é antecipar o fim do mandato. Nosso presidente, não acha isso. Já está em campanha. Já fala até em vice. Mourão diz que não será obstáculo, mas se for convidado -duvido- aceita. Moro é falado até para ser evitado como concorrente, se sobreviver à fogueira do Intercept.
Enquanto isso o Brasil tem mais de 2500 obras paradas, o canal do São Francisco não é concluído, falta energia elétrica para o país crescer, os madeireiros põem fogo no caminhão que iria abastecer o helicóptero que transportava pessoal do Ibama e o ministro do meio ambiente vai até lá fazer discurso de apoio aos agressores-devastadores-incendiários.
Enquanto isso lançamos no exterior a campanha da Embratur: “Brazil. Visit and love us”. Em inglês a frase estaria mais apropriada para um motel. É que a língua inglesa usa o pronome it quando se refere a lugares, coisas ou animais e o verbo amar pode se referir ao ato sexual. Já o us, como no caso, reforçou a conotação sexual da frase.
Ficou ruim para o Brasil de Bolsonaro.
Lá fora, estão tirando o maior sarro da nossa cara.








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