Renan troca estilo político moderado por perfil mais agressivo

Parlamentares ouvidos pelo G1 apontaram que nova postura do presidente do Senado é reflexo, entre outras coisas, das investigações da Operação Lava Jato.


Renan troca estilo político moderado por perfil mais agressivo


Por Fabiano Costa e Gustavo Garcia, G1, Brasília

Considerado até pouco tempo atrás um contrapeso ao perfil agressivo de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na política de Brasília, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), passou por uma metamorfose de estilo nos últimos meses.

Às vésperas de encerrar o terceiro mandato dele na presidência do Senado, o peemedebista desafiou na última semana o Supremo Tribunal Federal (STF), desobedeceu uma liminar que ordenava que ele se afastasse do comando da Casa e ainda provocou publicamente o ministro que decidiu tirá-lo da linha sucessória da Presidência da República (relembre o episódio no vídeo abaixo).

No fim das contas, Renan conseguiu se manter no comando do Congresso Nacional com a chancela de seis ministros da Suprema Corte, embora tenha sido proibido pelo tribunal de assumir a Presidência da República.


Alagoano de Murici, o senador deixou para trás, aos 61 anos, o perfil moderado que o transformou em um dos políticos mais influentes da capital federal e adotou um tom mais duro.


Na avaliação de colegas do Senado, o motivo da transformação e da irritação de Renan é o fato de ele ter se sentido acuado pela Operação Lava Jato e também por ter se tornado réu em uma ação penal no STF acusado de peculato, ou seja, desvio de dinheiro público (relembre o julgamento no vídeo abaixo).

Pai de três filhos, o parlamentar do PMDB – desde 1995 no Senado – é alvo de 11 inquéritos no Supremo, dos quais oito investigam se ele se beneficiou do esquema de corrupção que atuava na Petrobras.


"Ele [Renan] estava irritado já com os inquéritos, reiteradamente abordados nos noticiários, junto com as delações. Quando ele se tornou réu, o grau de irritabilidade aumentou. Eu senti uma redução da irritação com a decisão do pleno do Supremo", ressaltou o senador Álvaro Dias (PV-PR).


"Ele [Renan] enfrentou situações inusuais e teve uma postura inusual diante dessas situações", complementou o senador José Agripino Maia (DEM-RN).

Provocações a magistrados
O cerco do Ministério Público e da Polícia Federal (PF) fez o experiente senador do PMDB – que transita com desenvoltura nos corredores dos palácios de Brasília desde o governo Fernando Collor (1990-1992) – partir para o ataque.


Em outubro, irritado com a ação da PF no Senado que prendeu quatro policiais legislativos, Renan chamou de "juizeco de primeira instância" o magistrado da Justiça Federal de Brasília que autorizou a operação na Casa.



(Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)

Já na última terça (6), ele elevou ainda mais o tom, provocando, desta vez, o ministro do STF Marco Aurélio Mello, autor da liminar que afastava Renan do comando do Senado.


Ao se queixar da decisão do magistrado em uma entrevista coletiva, Renan afirmou que já "foi obrigado" a acatar liminares "piores" do ministro, entre as quais uma que o obrigou a voltar a pagar supersalários no Legislativo.


Um dos aliados mais fiéis do presidente do Senado, o senador João Alberto (PMDB-MA) disse ao G1 que o colega de partido "sempre foi um homem de posições firmes", mas que essa postura está mais evidenciada neste momento em razão do que chama de "interferências" de outros poderes no Legislativo.


"Renan está tendo as posições que sempre teve. Ele não aceita coisas estranhas à democracia. A posição dele e do Senado [no episódio do afastamento] aconteceram porque era a invasão de um poder em outro", destacou João Alberto.


Outro colega de partido de Renan, que preferiu não se identificar, afirmou ao G1 que o senador alagoano, mesmo em meio à turbulência política, é o parlamentar com pensamento político "mais aguçado" no Senado.


"Ele [Renan] é muito metódico. Até quando ele falou em 'juizeco', ele passou o final de semana pensando naquilo, achou que ia fazer um grande sucesso. Eu não teria usado essa expressão, mas, naquele momento, o foco dele era agradar o Senado, os colegas. Você precisa pensar qual mensagem ele quer passar. O Renan não é óbvio", observou este parlamentar.

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Abuso de autoridade
A crise que colocou Renan no epicentro político nesta semana não é a primeira que ele enfrenta na carreira parlamentar. Em 2007, o alagoano renunciou à presidência do Senado para evitar a cassação do mandato.


Na ocasião, ele foi acusado de ter despesas de uma filha com a jornalista Mônica Veloso bancadas por um lobista de uma empreiteira.


Apartado do comando do Congresso, ele permaneceu em um período de ostracismo no parlamento. Depois de articulações de bastidores, porém, retornou com força ao cenário político, conseguindo se eleger novamente para a presidência do Senado em 2013.


Nesta crise mais recente, Renan não se limitou a provocar publicamente magistrados. Em uma ação interpretada pelo Ministério Público como "retaliação" ao trabalho da Lava Jato, o presidente do Senado apresentou um projeto que endurece as punições para autoridades que cometem abuso de poder.


Com o argumento de que a atual legislação sobre abuso de autoridade está "defasada", o senador de Alagoas quer criar uma nova lei, com penas mais rígidas e novos tipos de crime para situações que forem enquadradas como excessos de juízes, promotores, procuradores e policiais.


A proposta polêmica colocou Renan em uma espécie de rota de colisão com o Ministério Público e com setores do Judiciário, que o acusam de tentar frear as investigações que envolvem políticos, como a Lava Jato.

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Renan tensionou ainda mais o cenário político no momento em que tentou, sem sucesso, aprovar um requerimento de urgência para votar o pacote anticorrupção que havia sido desfigurado pela Câmara - veja todas as propostas retiradas do projeto pelos deputados.


Fugindo do antigo estilo diplomático, ele ironizou o relator do pacote anticorrupção na Câmara, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), durante uma audiência no Senado que contava com a presença do juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância.


"Antes de encerrar, eu queria dizer apenas que não houve aqui agressão ao relator da matéria na Câmara dos Deputados, ao Onyx Lorenzetti. Parece nome de chuveiro, mas não é nome de chuveiro", afirmou o presidente do Senado na ocasião.


"Com todo respeito e em favor dele [Onyx], eu queria dizer que o teste de integridade vai fazer falta, porque pesava sobre ele uma acusação de ter recebido caixa dois de indústria de armas, e seria uma oportunidade para que ele, nesse teste, pudesse demonstrar o contrário, com o meu apoio", complementou, fazendo nova provocação ao deputado do DEM.

Retaguarda do Planalto


O presidente Michel Temer (esq.) e o senador Renan Calheiros (dir.), quando Temer assumiu a Presidência da República, em 31 de agosto (Foto: Beto Barata/PR)

Mesmo desgastado pelas investigações da Lava Jato e pela queda de braço com integrantes do MP e do Judiciário, Renan Calheiros continua sendo afagado pelo Palácio do Planalto na gestão Michel Temer como era no governo de Dilma Rousseff.


A explicação é o poder que o presidente do Senado detém de controlar o ritmo de andamento de assuntos de interesse do governo federal, como a Proposta de Emenda à Constituição que estabelece um teto para os gastos federais nas próximas duas décadas.


Na última terça-feira (6), dia em que Marco Aurélio determinou que o senador de Alagoas fosse afastado da presidência do Senado, Renan foi ao Palácio do Planalto se reunir com Temer.

Lá, ele narrou ao presidente da República suas preocupações em relação à sessão do dia seguinte do Supremo na qual seria definido se ele permaneceria à frente do Congresso Nacional.



O presidente Michel Temer (esq.) e o senador Renan Calheiros (dir.), durante encontro na casa de Renan, em abril deste ano (Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil)

Oposição
Embora tenha se tornado um dos principais fiadores do governo Temer no Legislativo, Renan conquistou a gratidão até mesmo de senadores da oposição.
Parte desses parlamentares mantém simpatia ao senador do PMDB após ele ter ajudado a articular o fatiamento da votação que permitiu à ex-presidente Dilma Rousseff mantivesse os direitos políticos mesmo depois de ser condenada pelo Senado no processo de impeachment.


No episódio desta semana no qual Renan se viu afastado da presidência do Senado por uma liminar do STF, um dos parlamentares mais atuantes na construção de uma saída pacífica para a crise institucional foi o senador Jorge Viana (PT-AC).


Primeiro-vice-presidente do Senado, o parlamentar petista seria o principal beneficiado com o afastamento de Renan do comando da Casa, na medida em que é o substituto imediato do peemedebista.


Se assumisse a presidência do Senado, Viana teria poder, inclusive, para adiar a votação do segundo turno da PEC do teto dos gastos públicos, prevista para terça-feira (13).


No entanto, Jorge Viana preferiu articular uma alternativa para Renan se manter no comando da Casa, procurando até mesmo ministros do STF.
O comportamento do senador petista levou Renan Calheiros a elogiar o vice-presidente do Senado.

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