Edgar Moreno: cadê os trilhos dessa rua

Era a primeira vez que D. Arcângela voltava a Bacabal desde que partira para onde os filhos em Brasília. Agora no assento cômodo do ônibus cogitava como havia de estar sua cidade natal. Não lhe era pequena a ânsia de rever a terra que a vira nascer, crescer, constituir família e num certo domingo de novembro a vira partir. Não queria sair do seu Mearim, mas, os filhos, não tendo cá oportunidades de trabalho rumaram a um centro mais evoluído, levando a mãe anos depois. Agora com o filho que ficara, D. Arcângela vislumbrava a paisagem andante.

Pelo vidro da janela trespassava-lhe uma dolorida ausência do farto babaçual que outrora abarrotava toda a extensão da estrada de rodagem. O rio Bambu fê-la recordar o movimento dos peixeiros no mercado velho. Um gosto de cravinho veio-lhe ao paladar lembrando-lhe o troca-troca de bolos e pratos caseiros na semana santa com os vizinhos da Rua do Maxixe e as histórias que ali ouvia e contava nas noites de lua cheia.

Já próximo ao antigo batalhão, as nuances urbanas denunciavam que a cidade era chegada. A idosa pôs os óculos para ver melhor a entrada da cidade, enquanto uma chuva de interrogações jorrava sobre o filho.

− Que muro grande é esse? E aquela rua? E essa estrada no meio do mato?

− Mãe, o muro é da universidade, a UFMA. Bacabal agora está cheio de faculdades e cursos de todo tipo. Aquela rua é uma avenida que vai dar no Ramal e a estrada é o aeroporto.

− E aqui já tem aeroporto, meu filho? Cadê o avião que não vejo?

− Desde 1990, mãe, mas só é usado pelos políticos de vez em quando e nunca foi escala de voo.

− Meu filho, esse deve ser o posto da Polícia Rodoviária Federal. Do mesmo jeito, meu Deus... E esta casona?

− É uma fábrica de congelados inaugurada recentemente.

− Vixe, meu filho, que ruas são essas de terra?

− É o Parque Rui Barbosa. Veja, mãe, fizeram mais esse posto de gasolina e um condomínio ali à frente.

− Condomínio em Bacabal?

− Sim, mãe, com a chegada das universidades e com os concursos públicos tem muita gente de fora ou daqui mesmo que prefere morar nos condomínios ou residenciais. Não é lá essas coisas, mas têm muitos de pequeno porte.

A chegada à COHAB III deixou a idosa um pouco decepcionada, pois sentiu falta de um portal de boas-vindas. Na rodoviária, mãe e filho foram surpreendidos por uns mendigos vindos da praça e do Caipirão a pedir-lhes “dois real”.

− Mãe, isso aí tudo é usuário de drogas. O número de moradores de rua aqui vem crescendo.

D. Arcângela ergue as vistas e reparando na estrutura do terminal de ônibus, estica o beiço e sai com o filho para o posto de táxi.

No dia seguinte, como combinado, ambos saem pelo centro.

− Quanta diferença, meu filho! Quantas igrejas! Já contei bem uma dúzia até aqui. Olha são quatro bancos tudo pertinho um do outro.

− Veja, mãe a ponte metálica, muito útil para os ribeirinhos da Trizidela. A praça e a Igreja matriz também estão mais bonitas.

− Meu Deus, o Armarinho Rianil ainda existe! Com as mesmas portas! Ainda restam alguns galpões de usinas. Mas, meu filho, cadê a casinha do Coronel Lourenço que ficava ali no Centro paroquial? A figueira brava em frente à prefeitura? A Casa do Fumo? Cadê a Praça do Bolo?

E após transporem toda a Teixeira de Freitas:

− Cadê, meu filho, os trilhos dessa rua?

− Vamos, mãe, há muita coisa ainda que não tem mais.
E seguiram entre o presente e o passado, entre a saudade e a esperança dessa cidade já grandinha.

COSTA FILHO, João Batista da que também representa o heterônimo Edgar 

Moreno.

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